Hoje, dia 21 de março, é celebrado o Dia Internacional da Síndrome de Down. A data, oficialmente estabelecida em 2006, foi escolhida pelo fato de que a Síndrome de Down é uma alteração genética no cromossomo 21, que deve ser formado por um par, mas, no caso das pessoas com a síndrome, aparece com três exemplares (trissomia). De acordo com dados da National Down Syndrome Society, estima-se que em um a cada 700 nascimentos seja de uma criança com Síndrome de Down, sendo ela a síndrome de ocorrência genética mais comum que existe.
E qual a importância desta data? O 21 de março quer trazer mais visibilidade ao tema e dissipar os preconceitos ainda existentes na sociedade, convidando-a a conhecer mais sobre a condição e abordando sobre a importância da inclusão social, respeito e bem-estar das pessoas que convivem com a síndrome. Não somente neste dia, mas em todos os outros do ano, é o momento de reduzir a origem do preconceito, que é a falta de informação correta; de combater a ideia de, erroneamente, se transformar uma diferença em rótulo, em uma sociedade cada vez mais sem tempo, sensibilidade ou paciência para o diferente.
Hoje, a Apae de Três de Maio - mantenedora da Escola de Educação Especial Helen Keller, do Centro de Atendimento Educacional Especializado e do Centro de Reabilitação em Deficiência Intelectual e Auditiva - atende 19 alunos com Síndrome de Down. Para marcar esta data, a entidade trouxe a história de três alunos atendidos na instituição que são portadores da síndrome, contada pelas mães.
Há 30 anos, Leonardo frequenta a Apae. Segundo a mãe, instituição oferece o atendimento que o filho necessita para se desenvolver, com profissionais capacitados e preparados
Sirlei Maria Sawitzki é mãe de três filhos. O Leonardo Schlosser - filho do meio -, hoje com 33 anos, nasceu com Síndrome de Down. Sirlei revela que na época foi um choque muito grande receber a notícia, já que teve uma gravidez tranquila e Leonardo nasceu de parto normal e com peso bom. "Comecei a perceber algumas coisas diferentes nele, que quase não chorava, não conseguia mamar e não reagia. Na consulta médica dele uma semana após o nascimento, o médico me disse que tudo indicava que o Leonardo fosse Down. Até que fomos a Porto Alegre e fizemos o cariótipo, que confirmou a condição."
A mãe de Leonardo conta que o filho tinha um problema cardíaco sério, o que não permitia que ele mamasse. "No primeiro ano de vida dele fizemos várias viagens para a capital gaúcha, para hospitais. Quando ele tinha onze meses, fez a cirurgia. Depois, diminuíram as internações, pneumonias e a medicação. Hoje ele tem acompanhamento e não toma mais remédios."
Ela relembra quando Leonardo iniciou na Apae de Três de Maio, há quase 30 anos. "Naquela época não havia uma estrutura como hoje. Eram algumas salas de aula onde os alunos eram atendidos. Lá em Porto Alegre recebi uma espécie de programa de estimulação, quando o Leonardo tinha pouco mais de um ano. Então eu comecei a trabalhar em casa com ele, até que uma moça que trabalhava aqui na secretaria da escola se ofereceu para me ajudar. Então, quando meu filho tinha três anos eu trouxe o material para cá e fazíamos as atividades aqui. Vínhamos uma vez por semana, por algumas horas. Tudo era novo e não havia tantas informações como hoje. Precisei buscar, me informar. Lia muito lá na clínica em Porto Alegre, onde me indicaram o Projeto Down, de São Paulo, com quem eu entrei em contato e aprendi muito", destaca.
Sirlei conta que hoje o filho está bem, dentro das possibilidades dele. "O Leonardo é bem calmo, tem dentro de casa uma rotina, em que ele é responsável por algumas atividades, como colocar a mesa, arrumar o quarto dele, coisas que ele sabe que são de responsabilidade dele e dentro dos horários que ele determina. Ele é independente." A mãe acrescenta que sempre levava e ainda leva o Leonardo para passear, nunca o escondendo. "Ele sempre está junto nas atividades. É muito sociável e é difícil alguém não gostar dele. Quando saímos, pra rua, encontramos muitos amigos dele. O Leonardo é muito querido."
Leonardo foi um dos alunos que, no ano de 2013, realizou um curso em uma empresa multinacional em Horizontina, para inserção no mercado de trabalho. De acordo com Sirlei, para ele foi a realização de um sonho, porque ele sempre falava em trabalhar. "Ele via a mãe e os irmãos saírem para trabalhar, então ele também queria. Ele gostou muito do período em que esteve lá."
Atualmente, Leonardo frequenta a Apae todas as tardes por semana e também tem atendimento com a fonoaudióloga. Conforme a mãe, ele adora a escola. "A estrutura da Apae é um espetáculo. Nem sei o que seria de nós sem a Apae. Imagina se ele fosse ficar só em casa? Não temos estrutura para dar atenção e acompanhamento como aqui. Na Apae encontramos profissionais capacitados e preparados. Aqui ele evoluiu muito, e foi na Apae que ele desenvolveu o gosto dele pelo esporte, chegando a participar das olimpíadas em que a escola competia." Sobre o futuro, Sirlei diz que imagina ela e o filho sempre juntos.
"Depois que se conhece sobre Down, a percepção sobre a síndrome muda. Muitas vezes condenamos os outros, mas é por ignorância mesmo sobre esta síndrome. O preconceito existe e acho que dificilmente deixará de existir. O ser humano é, digamos, estranho. Há pessoas que veem e tratam com naturalidade, mas outros têm receio. Quando ele era criança, me pediam o motivo desta condição. Hoje acredito que existe mais aceitação, devido às campanhas, e também porque muitas pessoas, depois que convivem, passam a ter uma admiração por eles", finaliza Sirlei.
"Aprendi que não podemos focar nas limitações, mas sim no potencial de cada um"
Betina Scherer da Silva tem seis anos. Frequenta a Apae duas tardes por semana para atendimentos com fisioterapeuta, terapeuta ocupacional e fonoaudióloga e também para acompanhamento no Atendimento Educacional Especializado, com professora. Na parte da manhã, é aluna do 1º ano na Escola Municipal de Ensino Fundamental São Pedro, em Três de Maio. A mãe, Ana, define a filha mais nova como uma criança com a autoestima lá em cima e fonte de inspiração, pois melhora o dia de qualquer pessoa.
A notícia da Síndrome de Down na Betina veio quando ela nasceu. Primeiramente, o pai, Rafael, recebeu a notícia do médico. A mãe, Ana, conta que teve uma suspeita na gravidez, não confirmada. "Contudo, como a Betina nasceu com sete meses, quando o médico pediu se tinha alguém na família com Down eu fiquei nervosa, mas eu trabalhei isso e pensei: 'se tiver, não vai mudar nada, porque ela vai ser minha de qualquer jeito'. Com a prematuridade, veio a preocupação com a questão de leito disponível em UTI, e a suspeita da síndrome passou despercebida. Assim que ela nasceu, já abriu a vaga e ela foi pra UTI. Neste momento o Rafael, recebeu a notícia de que ela era Down e cardíaca. O Down passou despercebido, pois o medo de perder ela era maior que qualquer outra coisa, e ser cardíaca também nos preocupava." Há 2 anos ela fez cirurgia cardíaca.
No hospital, Ana diz que leu muito sobre Síndrome de Down. Quando saíram de lá, tendo a Betina dois meses, a pediatra pediu avaliação com fonoaudióloga na Apae. Foi quando Ana solicitou que a Betina fosse avaliada com todos os profissionais, pois queria estimular ela da melhor forma possível. Desde então, ela recebe atendimento na Apae. "Confesso que chorei bastante no início, porque a gente não sabe como que vai ser. Hoje, eu sou muito mais preparada, mais forte, resolvida, pelas coisas que tive que viver e que por ela eu tive que passar. Meu maior medo era não conseguir dar suporte pra Betina, porque eu não tinha convívio com pessoas com Down."
Ana diz acreditar que o maior problema da sociedade seja o pré-conceito. "Luto todos os dias para combatê-lo, pois tenho certeza que a falta de informação alimenta o pré-conceito; esse a gente muda, mas o preconceito não, porque é escolha da pessoa."
Para Ana, escolas e família precisam caminhar juntas, em prol de um objetivo. "E no nosso caso acontece isso. A evolução dela foi nítida. Percebo que, para muitos pais, a maior preocupação é com o que o outro vai falar. Na Apae temos estímulo; é uma escola que olha com outros olhos. O suporte recebido aqui é essencial, pois é a base para que tudo dê certo. A Betina criou independência; eu me surpreendi com a evolução dela do ano passado pra cá. Ela vai pra casa sozinha de ônibus aqui da Apae; eu a levo, mas ela volta sozinha", comemora.
"Aprendi que não podemos focar nas limitações, mas sim no potencial de cada um. O Down não determina quem a pessoa é. A Betina pode ter tudo que ela quiser conquistar. Queremos que ela seja feliz e conquiste seus objetivos, sempre sabendo que o Down não vai limitar ela em nada. Digo que foi um acaso da união dos cromossomos, mas um acaso feliz, porque ela transformou nossa vida; ela me transformou. Hoje, depois de seis anos, eu tenho uma visão diferente. Sou forte, e esta força ela me dá para correr atrás dos direitos dela. Já precisei brigar por isso. Mas, se pudesse escolher, escolheria igual. A Betina foi um presente de Deus!"
"Eles são normais; só precisarão de mais estímulos"
Com quatro meses, a pequena Karen Dudar, de Três de Maio, é atendida na Apae três vezes por semana. Ela recebe atendimento dos profissionais de fisioterapia, terapia ocupacional e fonoaudióloga há quase três meses na Apae.
A mãe, Mônica, conta que teve polidramnia (uma alteração relacionada à quantidade de líquido amniótico no útero da mãe) na gestação. "Com 33 semanas me senti um pouco estranha. Então fiz uma ecografia e observaram que o índice de líquido amniótico tinha dobrado e que a Karen poderia ter uma obstrução no canal do esôfago. Então, fomos a Passo Fundo, onde ela nasceu com 33 semanas. Lá, a médica fez uma ecografia e me disse que ela teria uma síndrome, e corríamos o risco até dela não sobreviver. Quando nasceu, foi para a UTI devido a dificuldades para respirar. Como a médica disse que ela tinha características da Síndrome de Down, fizemos o cariótipo, que confirmou", relembra a mãe de Karen.
Foram quase dois meses na UTI em Passo Fundo. "Foi um susto, mas queríamos que ela saísse de lá logo e bem de saúde", destaca Mônica. Durante o período em que Karen esteve internada em Passo Fundo, a mãe Mônica revelou que foi se preparando para quando saíssem de lá. "Nesses dois meses eu tive tempo para me acostumar com esta nova condição, e torcia para ela sair da UTI. Fomos ao pediatra e então falei paro meu marido para procurarmos a Apae, pois aqui encontramos todos os profissionais no mesmo lugar. Chegando aqui, em dezembro do ano passado, fomos bem recebidos e logo iniciamos os atendimentos com a nossa filha", afirma Mônica.
"A Karen é uma bebê muito calma. Enquanto bebê, pra nós está sendo muito semelhante quando a Lauren (primeira filha do casal, hoje com quatro anos) era bebê. Claro, com mais alguns cuidados. O Down pode vir acompanhado de uma cardiopatia, por exemplo. A Karen tinha, mas foram sendo eliminadas as possibilidades; não ela não vai precisar passar por cirurgia, mas seguimos em acompanhamento. Hoje nossa única dificuldade está sendo com a alimentação dela, pois ela não mama; ela tem uma soda onde vai o leite."
Mônica diz que a expectativa é que a filha consiga mamar. "A Karen é uma bebê muito fofa e muito amada. Vamos acompanhando ela e durante o crescimento dela vamos enfrentando o que vier."
A trissomia que acometeu Karen é a trissomia livre, conforme Mônica. Os médicos, segundo ela, explicaram que há três tipos de trissomia, e em 95% dos casos ocorre a trissomia livre, que pode ocorrer com qualquer pessoa. Então, nós não pensamos 'Por que com nós?' e sim 'se acontece com tantos, porque com nós não?'" Para Mônica, família e amigos foram receptivos. "Ainda estamos nos adaptando e não enfrentamos nenhuma situação que nos incomodasse. Eles são normais; só precisarão de mais estímulos", finaliza.